Na última quinta-feira (26), Jean Paul Prates (PT-RN) foi aprovado por unanimidade como presidente da Petrobras pelo Conselho da companhia. A posse, no entanto, só deve acontecer em abril. Sob nova direção, a estatal será pressionada a reduzir o preço dos combustíveis, já que esta foi uma das promessas de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Para atingir o objetivo, Prates prevê, principalmente, a implementação de um fundo de estabilização para o preço dos combustíveis em épocas de alta da cotação do barril de petróleo. Na prática, a medida funciona como um “colchão” tributário para amortecer as variações para os consumidores.
A Conta de Estabilização dos Preços dos Combustíveis (CEP) seria um fundo para frear altas repentinas nos preços dos derivados do petróleo. A medida foi aprovada no Senado em março, mas segue estagnada na Câmara dos Deputados.
A ideia seria amenizar o preço dos combustíveis “na ponta da linha” sem mexer na política de paridade de importação da Petrobras, adotada em 2016, que obriga a empresa a reajustar o preço de acordo com o mercado internacional. Esse “colchão de amortecimento” seria custeado com recursos de:
participações do governo relativas ao setor de petróleo e gás destinadas à União, resultantes da concessão e da comercialização do excedente em óleo no regime de partilha de produção, ressalvadas as parcelas já vinculadas a determinadas áreas;
dividendos (lucros distribuídos a acionistas) da Petrobras pagos à União;
receitas públicas geradas com a evolução das cotações internacionais do petróleo bruto, desde que haja previsão em lei específica;
parcelas de superávits financeiros extraordinários.
Apesar de ser eficaz no combate à inflação, a proposta gera divergência entre economistas, que se preocupam, principalmente, com a fonte de recursos que subsidiará a nova política de preços.
Walter Franco, professor de Macroeconomia no Ibmec SP, ressalta que os preços das commodities são flutuantes e que, apesar da boa intenção de Prates, “uma hora a conta chega”.
“Essas políticas são datadas, não existe a possibilidade de não pagar a conta no futuro. Num estado endividado como Brasil, esse fundo ou vai onerar a empresa, ou os cofres públicos. Essa equação é financeira, não tem para onde fugir”, diz.
Marcio Lago Couto, da FGV Energia, afirma que os fundos de estabilização não conseguem impedir o repasse para os preços dos combustíveis, a não ser que o governo esteja disposto a gastar um volume significativo de recursos para subsidiar o consumidor de combustível.
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Para Cloviomar Cararine, economista e técnico da subseção do Dieese na Federação Única dos Petroleiros (FUP), o fundo é, na verdade, um paliativo. “O fundo resolveria em parte, porque limitaria a faixa de variação dos preços, mas traz um problema a ser discutido, que é da onde sairão os recursos que vão cobrir essa diferença”, diz.
“O embate que seria mais audacioso, mas que precisa ser enfrentado, é o de rever os lucros dos acionistas da empresa, que receberiam menos dividendos”, completa.
Ainda de acordo com Cararine, a medida é suficiente para conter o avanço inflacionário, no entanto, não resolve o problema no longo prazo, caso a fonte de recursos saia do cofre do governo federal, como foi feito pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, e replicado nos primeiros meses do governo Lula.
“A desoneração de impostos foi implementada como uma medida claramente eleitoreira. Por um lado, conteve os preços, mas, por outro, retirou recursos dos Estados, dos Municípios e da União”.
Segundo ele, a saída seria o abandono da política de paridade internacional e a retomada da política de investimento em novas refinarias, a fim de tornar o Brasil autossuficiente tanto na produção de gasolina, quanto de diesel.
Para Franco, do Ibmec-SP, a Petrobras deveria reduzir a dependência dos combustíveis fósseis e investir em alternativas de energia renovável.
“Porque o esforço que está sendo despendido na criação desse fundo não está sendo usado para debater novas fontes de energia?”, questiona.
Lago Couto, da FGV, sugere que a empresa retome a política de reajustes mais espaçados, pois, dessa forma, há proteção ao risco de flutuação nos preços do petróleo, “sem tanta confusão”.
Experiências semelhantes em países vizinhos
A criação de um fundo para subsidiar o preço dos combustíveis não é novidade na América Latina. No Chile e no Peru existem modelos semelhantes. O governo chileno, por exemplo, adotou um mecanismo automático de tributação conhecido como Mecanismo de Estabilização dos Preços Combustíveis (Mepco), em 2014.
Considerando o preço do petróleo no mercado internacional e o câmbio, semanalmente, um comitê ligado ao Ministério da Fazenda chileno determina o componente variável que é adicionado à base fixa do Imposto Específico dos Combustíveis, que corresponderia à Cide no Brasil.
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Esse componente pode ser negativo, no sentido de subsidiar o preço nos postou, ou positivo, em caso de redução do preço do barril de petróleo.
No Peru, caso haja redução do preço do barril de petróleo, os recursos arrecadados com essa alíquota formam uma reserva, usada para baixar o preço quando o petróleo sobe.
O professor de Economia do Ibmec-SP, Walter Franco, reforça que o problema desse modelo é como mensurar o limite que tornaria o imposto positivo ou negativo.
“Esse mecanismo, além de criar incertezas, mais uma vez teríamos o Estado interferindo na Petrobras. Isso, numa economia como a nossa, se torna uma conta muito difícil de ser administrada, e exige um processo de aprovação do Legislativo, ou seja, teria também um componente político muito preocupante”, afirma.
Marcio Lago Couto, da FGV Energia, diz que a maioria dos países desenvolvidos que adotaram o mecanismo no passado o abandonaram, uma vez que acabavam gerando um gasto elevado para o governo em subsídios e resultavam em pouca, ou nenhuma, contribuição para reduzir a inflação em períodos de aumentos contínuos nos preços dos combustíveis, como é o caso atual. Além disso, os fundos também se mostraram um instrumento complicado para gerir e criavam muita confusão no mercado.
“Historicamente, no Brasil, toda vez que o preço do petróleo sobe, os combustíveis sobem rapidamente e quando caem, os preços caem menos e mais lentamente. Existe uma literatura internacional que mostra que isso ocorre tanto no Brasil quanto no exterior, é o que chamamos de assimetria nos reajustes. A experiência internacional mostra que o saldo do fundo tende a ser quase sempre negativo, ou seja, que o governo tende a aportar muito mais recursos do que obtém para o fundo, seja por pressão política ou da população.”