ECONOMIA

The Good, the Bad and the Ugly

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Werner Roger, colunista do iG, dá dicas para investidores e quem quer começar
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Werner Roger, colunista do iG, dá dicas para investidores e quem quer começar

Talvez alguns aficionados pelo chamado western spaghetti tenham reconhecido o título e imediatamente lembrado da inesquecível trilha sonora de Ennio Morricone. Foi justamente do universo dos filmes de faroeste que veio esse título. Como de costume, títulos alusivos ao mundo da cultura servem como introdução de elementos que usaremos como apoio para apresentar nossa visão dos cenários econômico e financeiro.

O tal western spaghetti é um gênero de filmes nascido na Itália da década de 1960 — mas o nome foi criado nos Estados Unidos mesmo. Eram filmes de baixo orçamento, com atores que ainda não eram as estrelas, mas que se tornariam uns anos à frente.

Os “três homens” do título do filme de Leone são Blondie (Eastwood — o “Good”), Angel Eyes (Lee Van Cleef — o “Bad”) e Tuco Maria (Eli Wallach — o “Ugly”). A história se passa em 1862, durante a Guerra de Secessão (1861 – 1865), no Estado do Novo México. Os três formam parcerias tensas entre si para encontrar um tesouro dos Confederados (Estados do sul que lutam para manter o escravagismo nos EUA). Tuco e Blondie têm, cada um, parte da informação sobre onde o tesouro estaria enterrado — mas não se entendem, ora são aliados, ora se odeiam. Angel Eyes não tem nenhuma informação; ele se une ao time de olho em, depois de encontrado o tesouro, ficar com tudo.

“Ok, Werner — agora explique o que isso tem a ver com as finanças.”

Vamos lá. Muitos investidores estão felizes com os ganhos da renda fixa, nascidos dos juros elevados. Uma parte até gostaria de alocar mais recursos em renda variável; eles sabem que, no longo prazo, investir em boas empresas traz maiores retornos: afinal, elas crescem, e com elas, seus dividendos — gerando riqueza ao acionista. A questão diante desses investidores é: quando investir? Qual o melhor momento? Quando os juros irão cair?

Na analogia com o filme, o mercado (investidores) é Angel Eyes, o “Bad”: não faz ideia de onde o tesouro está, mas quer encontrá−lo. O “Good” é o ministro Fernando Haddad (Fazenda), que busca crescimento e prosperidade (o tesouro Confederado) — mas não consegue atingir essas metas porque Roberto Campos Neto, o “Ugly”, é o vigia da inflação e, com a taxa Selic, impede que Haddad e o mercado cheguem ao tesouro.

O Brasil, então, está assim: dois homens — Haddad/Good e Campos Neto/Ugly — têm o poder, mas cada um tem uma agenda própria, ora se entendem, ora não; o mercado/Bad também quer a prosperidade, mas não faz ideia de como chegar lá, porque nunca consegue estar com toda a informação — ora pende para um lado (Haddad e o discurso do arcabouço fiscal), ora para outro (Campos Neto e a insistência na inflação e juros elevados).

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Para demonstrar os efeitos das taxas de juros, levantamos os resultados das empresas negociadas na B3 em sua totalidade, mas ponderando pela capitalização. Fizemos o mesmo procedimento para os principais índices usados em nossos principais fundos: ponderando os próprios índices e todas as empresas investidas por nós, como se fosse uma única carteira.

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Interessante que o crescimento de 5% das receitas no 1T23 das empresas negociadas da B3 conversa com o de 4% do PIB do mesmo período sobre o 1T22 e o de 1,9% sobre o 4T22. Mais interessante: quem puxou esse crescimento foram as empresas do índice small caps (SMLL), com 10% (ante o recuo de 4% das grandes empresas do IBOV). Agora, prepare−se: as empresas investidas pela nossa gestora cresceram 13%. E 12% para o nosso ETF, TRIG11, que compõem as empresas que representam 5% das menores empresas negociadas na B3 pelo critério de capitalização (valor de mercado), e alguns critérios adicionais que estabelecemos, como liquidez e governança.

Analisando o retorno dos índices até o final de maio, o SMLL já ultrapassa o IBOV, com valorização de 4,7% (alfa de 6% sobre o retorno negativo do IBOV). O mais inusitado é ver a forte queda de lucro líquido refletir uma safra de resultados bem fracos e impacto dos juros e despesas financeiras. E, não obstante tudo isso, o índice teve comportamento positivo, deixando o IBOV e suas gigantes para trás.

Esse comportamento indica que mercado/Angel Eyes acredita que Haddad/Blondie e Campos Neto/Tuco chegarão a um bom termo, juntando informações para construir o mapa que levará ao tesouro. Só é preciso que Tuco e Blondie se entendam. E o mercado/Angel Eyes já vai se posicionando, vendo o ouro brilhar — ainda não nas suas mãos, mas cada vez mais próximo.

Destacamos o comportamento do IGP−M, que, ao cair 1,84% em maio, levou a deflações de 2,58% no ano e de 4,47% em 12 meses, ante uma inflação de 10,72% em doze meses observada em maio de 2022, ou uma desaceleração de nada menos de 15,19% em doze meses, talvez inédita. O Banco Central teima em manter a Selic em 13,75% — um juro real de mais de 18% sobre o IGP−M de 12 meses. Com petróleo, petroquímicos, minério de ferro, siderurgia e produtos agropecuários apresentando forte queda de preços, não há pressão inflacionária sobre os custos relacionados a estes produtos (de grande importância na economia e para medir a inflação).

Da mesma forma, a energia tem seus preços vinculados a IGP−M e IPCA, além de uma forte redução de encargos regulatórios (especialmente pelo menor uso das termoelétricas) e dos preços de gás natural, diesel e óleo combustível. O IPPA−CEPEA/ESALQ índice de preços pagos ao produtor) está deflacionado em 13,2% nos 12 meses de maio de 2022 a abril deste ano — o que evidencia que não há pressão inflacionária no custo da alimentação.

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Tudo isso, e o BC ainda não deu início a tão esperada redução da taxa Selic. É um mistério que talvez nem um “dream team” de detetives formado por Sherlock Holmes, Hercule Poirot, Sam Spade, Philip Marlowe, Tony Baretta, Theo Kojak, o Tenente Columbo e Adrian Monk pudesse resolver.

A respeito do PIB, estamos bem−posicionados em termos setoriais. O agropecuário apresentou expansão de 21,6% no 1T23, tendo a safra recorde de grãos (22/23) plantada ainda no governo anterior (set – nov/22) como a grande responsável. Mas a colheita coincidiu com preços descendentes e problemas de escoamento — e isso terá impacto negativo na renda dos produtores (exceto, claro, daqueles que travaram preços em patamares elevados observados ano passado). A boa notícia é o efeito na inflação.

Também estamos bem−posicionados na indústria — e ainda mais no segmento automotivo pesado. O ministro Haddad, com apoio do BNDES, deverá apresentar logo medidas de incentivo à renovação da frota de caminhões e à redução tributária ou compensatória nos veículos populares — o que deve ajudar nas vendas e produção da indústria automobilística. Também são esperados com grande ansiedade o volume de recursos e as condições para o Plano Safra 23/24. De nossa parte, esperamos principalmente quanto será voltado a investimentos em armazenagem e em modernização da frota de máquinas agrícolas.

Prezado leitor, esperamos que a inusitada analogia com o universo do faroeste, visto pela lente de Sergio Leone, tenha lançado alguma luz sobre a atuação de Ministério da Fazenda, mercado e Banco Central. Há conflitos entre os três, cada qual tem seus interesses — mas o mercado de renda variável oscila na direção de Haddad, e já se posiciona para o momento em que as partes do mapa do tesouro serão encaixadas e conhecidas. A Selic começando a cair será como os mocinhos que cavalgam rumo ao pôr−do−sol no horizonte.

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Para nós, venha quando vier o início da queda dos juros, seguimos com nossa estratégia inalterada e vencedora nestes cinco anos de muita turbulência. O movimento dos juros para baixo terá o efeito top−down de fazer o mercado se posicionar previamente nos setores mais expostos, criando um movimento de alta nas small e micro caps.

Acreditamos, no entanto, que a queda dos juros será gradual e lenta. Até que seu efeito seja capturado pela economia real e nos resultados das empresas, pode ser que transcorra um bom tempo. Investidores podem acabar um tanto frustrados com os próximos resultados trimestrais de 2023. Não percam os próximos capítulos (nem as próximas colunas).

Fonte: Economia

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