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Casar com menor de idade não é ilegal, mas é imoral

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Hissam Hussein Dehaini se casou com adolescente de 16 anos
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Hissam Hussein Dehaini se casou com adolescente de 16 anos

O caso do prefeito do município de Araucária, no Paraná, Hissam Hussein Dehaini, de 65 anos, que se casou com uma adolescente de 16 anos, é indigesto por inúmeros aspectos. Para muitos, chamou a atenção o fato de ele ter nomeado a mãe da garota como secretária de Cultura e Turismo da cidade no dia seguinte ao casamento. Mas é a união em si que levanta o debate sobre o casamento infantil.

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Os dados sobre a questão são inconsistentes no Brasil. Segundo dados levantados pelo jornal O Globo junto a Associação Nacional do Registradores de Pessoas Naturais (Arpen), entre 2021 e março deste ano, 7.228 menores de idade se casaram no Brasil. De acordo com levantamento solicitado à instituição, somente nos primeiros três meses deste ano 718 pessoas entre 16 e 18 anos estabeleceram uma união civil. Por lei, o casamento de menores é permitido no país desde que autorizado por um responsável legal. Em 2021, o Brasil registrou 3.334 casamentos com menores de idade, número que apresentou pouca diferença em relação ao ano passado, quando 3.176 uniões foram registradas em cartório. O quantitativo, no entanto, pode ser mais elevado, visto que os anos computados pela Arpen mais de 1,7 milhão de casamentos não tiveram a idade de uma das pessoas ou do casal informada.

Para Melina Fachin, advogada, pós-doutora em democracia e direitos humanos no Centro para os Direitos Humanos e a Democracia da Universidade de Coimbra, Portugal, e professora da UFPR, tanto nossa Constituição, como o ECA e as convenções internacionais, dada a gravidade do casamento infantil, previram regras para erradicar a prática, que interrompe de maneira extremamente precoce o desenvolvimento das meninas, muitas vezes acarretando violências e abusos a estas.

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“Todavia, ainda que o Brasil tenha ratificado todos estes documentos internacionais e possua leis protetivas, é um dos países do mundo que possui o maior número de casamentos infantis. Por mais que formalmente o casamento seja permitido somente após os 18 anos de idade, ou, em hipóteses específicas, aos 16 anos, informalmente todos os anos diversas meninas brasileiras são submetidas à prática. Entretanto, diferentemente de outros países com alta incidência de casamentos prematuros, no Brasil as meninas possuem certa gerência na decisão acerca do casamento, que pode decorrer principalmente de gravidez precoce, convívio familiar conturbado ou violento, pobreza ou evasão escolar”, analisa a advogada.

Uma vez casadas, as meninas se voltam aos trabalhos domésticos e, em não raras vezes, aos cuidados dos filhos. “Com isso, abandonam os estudos e se afastam de integrar o mercado de trabalho formalmente. Ademais, muitas têm sua mobilidade severamente controlada, deixando de possuir contato com amigos próximos e até mesmo com a família, sendo que algumas até mesmo são vítimas de violência praticada pelo parceiro íntimo. Dessa forma, além das proibições legais e em tratados internacionais, para erradicar o casamento infantil são necessárias iniciativas e políticas públicas que envolvam a permanência escolar, o acesso à saúde sexual e reprodutiva, o empoderamento feminino e programas econômicos que atenuem a situação de pobreza dos familiares das meninas, fornecendo-lhes melhores condições de escolher as vidas que querem viver”, analisa Melina.

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Segundo Lygia Maria Copi, advogada, doutora em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná – UFPR, professora universitária e autora de livros e artigos na área de Direito da Infância e Direito de Família, “em primeiro lugar, o casamento de pessoas que estão na faixa etária de 16 e 18 anos pode ser compreendido como uma situação que viola o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, inscrito no art. 227 da Constituição Federal. O casamento infantil pode gerar consequências graves na vida do sujeito, como por exemplo, a evasão escolar, a falta de profissionalização, a exclusão do mundo do trabalho e da dependência financeira do outro cônjuge”.

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No caso do casamento entre o prefeito de Araucária-PR e a jovem, vale ressaltar ainda que, no dia seguinte à cerimônia, a mãe da adolescente que já ocupava cargo comissionado na Prefeitura de Araucária foi nomeada como Secretária de Cultura do Município. “Tal conduta pode ser configurada como nepotismo, mas, além disso, nos leva a refletir sobre os reais motivos desse e de tantos outros matrimônios com jovens país afora”, avalia Lygia.

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“Em uma breve análise, a conclusão a que se chega é quanto a real necessidade de alteração da legislação brasileira, de uma atualização das normas a fim de coibir tais laços matrimoniais com crianças e jovens que não completaram a maioridade. Antes de tudo, deve ser priorizado o melhor interesse de crianças e adolescentes”, recomenda a advogada.


Fonte: Mulher

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